Tiago Mestre

La Californie

 

Texto de Bruno Mendonça

 

Centro Cultural São Paulo, Brazil, 2016

 

First 

 

Second

 

Third

 

Fourth

 

Fifth

    Tiago Mestre – La Californie

    No projeto La Californie o artista Tiago Mestre se apropria do nome da famosa vila construída em 1920, em Cannes, no sul da França, onde Pablo Picasso habitou e que transformou em atelier a partir de 1955. Neste projeto o artista toma o espaço do ateliê de artista como mote para discutir de maneira poética uma série de camadas associadas a este espaço, mas também de forma mais abrangente questões relacionadas ao sistema da arte contemporânea como um todo.

    O espaço do ateliê de artista e seu viés romântico, enigmático/mágico e projetivo já foram analisados de diferentes maneiras por teóricos de diversas áreas, a fim de compreender como se deu essa construção aurática deste espaço ao longo da história, tornado o artista uma espécie de artífice e o inserindo em uma das tipologias mais complexas de trabalhador dentro da lógica de produção moderna, assim como para desconstruir e desmistificar este mesmo espaço a partir de uma visão pós-moderna ou contemporânea. Neste projeto Tiago Mestre obviamente está interessado nestas questões ao deslocar este espaço para dentro da instituição, como já foi feito por outros artistas no campo da arte contemporânea – sendo assim uma operação recorrente e que o artista tem consciência disso – mas que para o artista este não é o eixo central de La Californie.

    Neste projeto Tiago Mestre está mais interessado em desdobrar e tornar público um dos principais procedimentos de sua prática artística que é uma noção conceitual e expandida de edição e montagem assim como seu interesse pelo espaço arquitetônico e suas possíveis configurações como ambiência. Apesar de uma materialização plástica de pesquisas temáticas, que poderíamos colocar como um primeiro momento no trabalho do artista existe também um segundo e importante momento que é o desenvolvimento da exposição e sua construção espacial. É aqui que Tiago Mestre começa a operar procedimentos de edição e montagem e inicia uma reflexão do espaço para transformá-lo em um ambiente – isso se dá tanto na expografia projetada pelo artista, assim como pelos mobiliários e disposição das obras. Em La Californie, Tiago Mestre revela ao público este programa.

    Para o artista outro ponto fundamental em La Californie e que é articulado conceitualmente a partir do deslocamento do ateliê para o espaço público da instituição é discussão acerca do artista como trabalhador a partir de uma noção de labor e isto dentro de um contexto neoliberal e de um atual sistema capitalista que tem por consequência modulado um mercado de arte cada vez mais complexo que tem a capacidade de transformar quase todos os tipos de práticas e processos artísticos em “produto”. Estas ressonâncias sócio-políticas e econômicas que giram em torno do artista como talvez umas das figuras mais desafiadoras de análise neste sentido são investigadas pelo ensaísta argentino Reinaldo Laddaga em seu livro “Estética de Laboratório”, a partir de alguns objetos de estudo como o artista Thomas Hirschhorn e seu projeto Museu Precário, por exemplo.

    Assim como Thomas Hirschhorn, Laddaga analisa também a produção do artista Pierre Huyghe que em um de seus textos analisando seu próprio processo de criação levanta questões interessantes que se conectam de forma bastante poética com o projeto La Californie de Tiago Mestre. Huyghe escreve: “A construção torna imediatamente visível suas opções e os processos que a constituem. Os erros, as redundâncias, os esquecimentos, as bifurcações […] não se trata de uma construção linear, mas de uma que tem múltiplas direções, aberta às possibilidades, às variações, cujos recursos de mudança e cuja acessibilidade são permanentes. É uma construção do potencial. Cada etapa revela índices de uma virtualidade. O visível está mais próximo do que é observado, não é uma finalidade, mas um esboço, um ponto de partida. É o necessário de hoje, completar e habitar. Aqui, o processo se inverteu, se inicia, se habita, e completar é um termo que fica por definir. Pôr fim ao acabamento, indeterminar. Viver com o transitório, no estado de edifício em permanente construção, interrompido, ou melhor na espera. Como um estado de inacabamento pode se tornar uma maneira de fazer.” 

Bruno Mendonça

 

    Tiago Mestre – La Californie

     In La Californie, Tiago Mestre points to the name of the famous villa built in 1920 in Cannes, southern France, where Pablo Picasso lived and transformed into studio from 1955. In this project the artist takes the space of the studio artist as a theme to discuss poetically a number of layers associated with this villa but also, more broadly, issues related to contemporary art system as a whole.

    The artist’s studio and its romantic, enigmatic / magic and projective bias have been analyzed, in different ways, by theorists from various fields, in order to understand how the auratic construction of this space happened throughout history, transforming the artist in a kind of a craftsman and defining him as one of the most complex types of workers within modern production logic, as well as to deconstruct and demystify this same space from a post-modern or contemporary vision. Tiago Mestre is obviously interested in these issues as he brings this  “space within the institution, as has been done by other artists in the field of contemporary art – thus a recurring operation and that the artist is aware of this – but for the artist this it is not the central axis of La Californie.

    In this project Master James is more interested in deploying and make public one of the main procedures of his artistic practice that is a conceptual idea and expanded editing and assembly as well as its interest in the architectural space and its possible configurations as ambience. Although a plastic materialization of thematic research that we could put as a first point in the artist’s work there is also a second important point is that the development of the exhibition and its spatial construction. This is where James Master starts operating editing and assembly procedures and initiate a reflection space to turn it into an environment – it takes both expography designed by the artist, as well as the furniture and arrangement of works. La Californie, Master James revealed to the public this program.

    For the artist another key point in La Californie and that is articulated conceptually from the studio of the shift to the public space of the institution is discussion about the artist as a worker from a notion of labor and this within a neoliberal context and a current capitalist system which result in a market modulated art increasingly complex that has the ability to turn almost all types of art practices and processes “product”. These socio-political resonances and economic revolving around the artist as perhaps one of the most challenging figures of analysis in this sense are investigated by the Argentine essayist Reinaldo Laddaga in his book “Laboratory Aesthetics” from some objects of study as the artist Thomas Hirschhorn and his project Precarious Museum, for example.

    Just as Thomas Hirschhorn, Laddaga also analyzes the production of the artist Pierre Huyghe that in one of his texts analyzing their own creation process raises interesting questions that connect quite poetic way with the project La Californie James Master. Huyghe writes: “The building is immediately visible your options and processes that constitute it. The errors, redundancies, the oversights, the bifurcations […] this is not a linear construction, but one that has multiple directions, open to possibilities, to variations, whose change of resources and whose accessibility are permanent. It is a construction potential. Each step reveals contents of a virtuality. The visible is closer to what is observed is not an end but a draft, a starting point. It is necessary today, complete and at home. Here, the process is reversed, starts, it dwells and complete is a term that is undefined. Putting an end to the finish, indeterminar. Living with the transition in building state of permanent construction, interrupted, or rather on hold. As a state of incompleteness can become a way to do. “

Bruno Mendonça